A febre do Oropouche emerge como uma das principais preocupações epidemiológicas do Brasil em 2025, com números recordes que demandam atenção imediata das autoridades de saúde e da população.
Esta arbovirose, causada pelo vírus Orthobunyavirus oropoucheense (OROV), representa um desafio crescente para o sistema de saúde brasileiro .
O Que É a Febre do Oropouche
A febre do Oropouche é uma doença viral aguda causada por um arbovírus do gênero Orthobunyavirus, identificado pela primeira vez no Brasil em 1960 durante a construção da rodovia Belém-Brasília 1. O vírus foi isolado inicialmente de uma amostra de sangue de bicho-preguiça, marcando o início da vigilância epidemiológica desta enfermidade no território nacional .
Historicamente restrita à região amazônica, considerada endêmica, a doença experimentou uma expansão geográfica sem precedentes a partir de 2024 . Esta dispersão está associada ao surgimento de uma nova variante viral que emergiu entre 2010 e 2014 na região central do Amazonas .
Situação Epidemiológica Atual (2025)
Números Alarmantes
O Brasil já registrou mais de 10.000 casos de febre do Oropouche em 2025, representando um aumento de 56% em comparação ao mesmo período de 2024 . Os dados mais recentes mostram que nas primeiras cinco semanas de 2025, foram confirmados 2.791 casos, com concentração significativa no Espírito Santo (2.652 casos) .
Distribuição Geográfica
A transmissão autóctone foi confirmada em 22 estados brasileiros durante 2024, expandindo drasticamente além da região amazônica tradicional . Os estados mais afetados em 2025 incluem:
- Espírito Santo: 6.118 casos confirmados
- Rio de Janeiro: 1.900 casos
- Paraíba: 640 casos
- Ceará: 573 casos (Fonte UOL)
Mortalidade
O Brasil registrou as primeiras mortes por febre do Oropouche no mundo em 2024, totalizando quatro óbitos confirmados até maio de 2025 . Três mortes ocorreram no Rio de Janeiro e uma no Espírito Santo, todas em adultos entre 23 e 64 anos .
Transmissão e Vetores
Vetor Principal
A transmissão ocorre principalmente através da picada do inseto Culicoides paraensis, popularmente conhecido como maruim ou mosquito-pólvora . Este diminuto artrópode hematófago, medindo aproximadamente 1,5 mm, prolifera em ambientes com alta umidade e matéria orgânica em decomposição .
Ciclos de Transmissão
Ciclo Silvestre: Envolve bichos-preguiça e primatas não-humanos como hospedeiros naturais, com vetores incluindo Coquillettidia venezuelensis e Aedes serratus além do Culicoides paraensis .
Ciclo Urbano: Os humanos atuam como principais hospedeiros, com o Culex quinquefasciatus (pernilongo) também podendo transmitir o vírus em ambientes urbanos .
Características do Vetor
O maruim apresenta atividade principalmente durante manhãs e entardeceres, embora possa ser encontrado durante todo o dia . Sua proliferação está intimamente ligada a:
- Acúmulo de matéria orgânica (folhas e frutos em decomposição)
- Proximidade com plantações (especialmente bananeiras e cacaueiros)
- Ambientes com alta umidade
Sintomas e Manifestações Clínicas
Sintomas Iniciais
Os sintomas da febre do Oropouche são similares aos da dengue e outras arboviroses, incluindo :
- Febre de início súbito
- Cefaleia prolongada e intensa
- Mialgia (dor muscular)
- Artralgia (dor articular)
- Náuseas e vômitos
- Diarreia
Sintomas Secundários
Manifestações adicionais podem incluir :
- Tontura
- Dor retro-ocular
- Calafrios
- Fotofobia
- Petéquias e sangramentos
Complicações Graves
Casos com acometimento do sistema nervoso central, como meningite asséptica e meningoencefalite, podem ocorrer, especialmente em pacientes imunocomprometidos . Uma característica distintiva da doença é a possibilidade de recidiva, com reaparecimento dos sintomas após 1 a 2 semanas das manifestações iniciais .
Duração dos Sintomas
Os primeiros sintomas aparecem entre 3 a 8 dias após a picada do inseto infectado, com duração típica de 2 a 7 dias . O vírus permanece no sangue do paciente por 2 a 5 dias após o início dos sintomas 1.
Transmissão Vertical e Riscos na Gravidez
Casos Confirmados
O Brasil foi pioneiro mundial na confirmação de casos de transmissão vertical do vírus Oropouche . Foram documentados casos de transmissão da mãe para o feto, resultando em óbitos fetais e anomalias congênitas.
Monitoramento de Gestantes
Toda gestante que apresentar sintomas compatíveis deve ser acompanhada rigorosamente durante todo o pré-natal . O vírus foi detectado em diversas amostras fetais, incluindo líquido cefalorraquidiano e tecidos cerebrais .
Diagnóstico
Critérios Diagnósticos
O diagnóstico da febre do Oropouche baseia-se em três pilares 1:
- Avaliação clínica: Sinais e sintomas compatíveis
- Laboratorial: Resultado positivo para Oropouche
- Epidemiológica: Ocorrência de casos no local ou histórico de deslocamento
Janela Diagnóstica
O teste laboratorial deve ser realizado até o quinto dia do início dos sintomas para maior precisão diagnóstica .
Tratamento – Ausência de Tratamento Específico
Atualmente não existe tratamento específico ou vacina disponível para a febre do Oropouche . O manejo é puramente sintomático e de suporte .
Medicações Recomendadas
O tratamento sintomático inclui :
- Analgésicos: Paracetamol para controle da dor
- Antitérmicos: Dipirona para redução da febre
- Hidratação: Via oral ou parenteral conforme necessário
Medicações Contraindicadas
São expressamente contraindicados :
- Anti-inflamatórios não-esteroidais (ibuprofeno, diclofenaco, nimesulida)
- Ácido acetilsalicílico (AAS)
- Corticoides
Estas medicações aumentam o risco de manifestações hemorrágicas .
Medidas de Prevenção
Proteção Individual
As principais medidas preventivas incluem :
- Roupas protetoras: Calças compridas, camisas de manga longa, meias e sapatos fechados
- Repelentes: Aplicação de repelentes contendo DEET nas áreas expostas
- Horários de menor exposição: Evitar atividades ao ar livre durante amanhecer e entardecer
Proteção Domiciliar
Barreiras físicas :
- Instalação de telas de malha ultrafina (inferior a 1,5mm) em janelas e portas
- Uso de mosquiteiros durante o repouso
- Fechamento completo de aberturas quando possível
Manejo Ambiental
Controle de criadouros :
- Manutenção do peridomicílio limpo
- Remoção de acúmulo de material orgânico (folhas, frutos em decomposição)
- Limpeza regular de áreas próximas a plantações
- Drenagem de áreas com água parada rica em matéria orgânica
Cuidados Especiais para Gestantes
Gestantes devem adotar precauções adicionais :
- Evitar atividades de limpeza de quintais
- Não se expor a ambientes com risco elevado de vetores
- Uso rigoroso de medidas de proteção individual
- Busca imediata por atendimento médico em caso de sintomas
Aspectos Genéticos e Evolução Viral
Rearranjo Genético
O vírus Oropouche passou por um rearranjo genético significativo, adquirindo sequências de outros dois vírus amazônicos (Iquito e PEDV) . Esta característica do genoma segmentado facilita trocas genéticas que podem alterar a virulência e capacidade de transmissão .
Nova Variante
A variante responsável pelo surto atual surgiu entre 2010 e 2014 na região central do Amazonas e se disseminou silenciosamente por uma década antes da explosão de casos em 2024 . Pesquisadores investigam se essas mudanças genéticas estão associadas às manifestações graves e maior transmissibilidade .
Vigilância Epidemiológica
Monitoramento Nacional
O Ministério da Saúde estabeleceu o Centro de Operações de Emergências para Dengue e Arboviroses, que monitora não apenas a dengue, mas também Oropouche, Chikungunya, Zika e Febre Amarela. A vigilância foi intensificada com a distribuição de testes diagnósticos para toda a rede nacional de laboratórios .
Capacitação Profissional
Estão sendo conduzidas capacitações sistemáticas para profissionais de saúde e vigilância, além de seminários com pesquisadores para compartilhamento de conhecimentos sobre a doença.
Perspectivas e Desafios Futuros
Pesquisa e Desenvolvimento
O Ministério da Saúde conduz pesquisas sobre:
- Ferramentas de controle do vetor
- Desenvolvimento de vacinas
- Medicamentos antivirais específicos
- Mecanismos de transmissão vertical
Preparação para Surtos
Com a chegada das estações mais quentes e úmidas, há expectativa de aumento nos casos, demandando preparação adequada dos serviços de saúde e intensificação das medidas preventivas .
Conclusão
A febre do Oropouche representa um desafio epidemiológico crescente no Brasil, exigindo ação coordenada entre autoridades de saúde, profissionais médicos e população . A ausência de tratamento específico e vacina torna as medidas preventivas fundamentais para o controle da doença .
O cenário atual, com números recordes de casos e expansão geográfica sem precedentes, demanda vigilância constante e implementação rigorosa de medidas de controle vetorial . A compreensão dos fatores que contribuíram para esta explosão epidemiológica, incluindo as alterações genéticas virais e mudanças ambientais, será crucial para o desenvolvimento de estratégias de controle mais efetivas .
A população deve manter-se informada sobre os sintomas, medidas preventivas e a importância da busca por atendimento médico precoce . Apenas através de uma abordagem integrada e baseada em evidências científicas será possível controlar esta emergente ameaça à saúde pública brasileira .